Todo amor que eu sinto por ti
O ano era 2003.
A decoração que cobria as ruas, mostrava que o Natal estava chegando.
Mas que Natal que nada, meu coração só pensava em uma coisa: ele estava chegando.
O primeiro herdeiro do nosso núcleo familiar.
Meu primeiro sobrinho!
Quem diria que eu realmente “ficaria para titia”.
O ditado que geralmente soa mal para algumas mulheres, caiu muito bem para os meus ouvidos!
Iria ser titia pela primeira vez!
Finalmente, no dia 7 de Novembro, ele chegou.
E já chegou dizendo a que veio, nome de rei: Arthur!
Nem preciso fechar os olhos, para me transportar para a maternidade naquele dia ensolarado.
Com a cara colada no vidro, eu esperava ansiosa para que a enfermeira viesse mostrar o nosso pequeno.
Nunca encontrei palavras que pudessem descrever aquele momento.
O momento em que os meus olhos se encontraram com aqueles olhinhos, abertos e brilhantes.
Sim, foi amor à primeira vista!
Entre tantas coisas que passaram na cabeça dessa tia de primeira viagem, uma delas da primeiras foi: mais um palmeirense para a família!
Ah, vocês sabem muito bem como é, família que tem DNA alviverde, não pensa em outra coisa.
Quando nosso principesinho começou a entender de futebol, aconteceu o que acontece quando os pais se separam e torcem por times diferentes: um baita conflito!
Do lado de lá, seu pai, que é são paulino, queria, com toda razão, que o pequeno torcesse para o seu time.
Nós, do lado de cá, é claro, queríamos que ele seguisse o amor que nós temos pelo nosso Palmeiras.
E lá estava ele, no meio da confusão.
O garotinho esperto, ficava em cima do muro, para não desagradar ninguém.
Mas o que já estava complicado, piorou.
Quando tinha seis anos, os melhores amigos da escola, torciam para o nosso arquirrival e por causa disso, ele começou a mostrar certo interesse naquele, cujo o nome, nós nem gostamos de falar.
Não podia ser.
Isso não!
Um dia, gritou do quarto: “Vou torcer para quem eu quiser e pronto”.
A tia, mesmo decepcionada, sabia que ele tinha razão.
Com o coração na mão, decidimos pelo o que era o certo: ele precisava conhecer todos os times e fazer a sua própria escolha.
Afinal, não é assim que nasce um grande amor?
E assim foi.
Foi com o pai ao estádio.
E conheceu o time dos colegas.
Até que chegou a nossa vez de apresentar a ele o time do nosso coração.
Janeiro de 2010, noite quente de verão, primeiro jogo do campeonato paulista, estádio do Pacaembu.
Palmeiras x Botafogo de Ribeirão Preto.
Ele entrou meio desconfiado e assistiu a um jogo monótono, com um placar que não saía do 0x0, para o desespero do meu pai, que me olhou e disse baixinho: “Bem que o Palmeiras podia fazer um gol…”
Balancei a cabeça afirmativamente, enquanto por dentro, xingava o time.
No final do segundo tempo, ele fez a única pergunta que eu temia ouvir:
“Tia Alê, o Palmeiras não vai fazer nenhum gol?”
E agora? O que eu dizer? Ele estava certo.
Queria ver gols, comemorar, queria escolher seus ídolos, como toda criança da sua idade.
Que motivos tinha para torcer por aquele time?
Os rivais faziam boas campanhas, já o Verdão, sofria com jejuns e um time, que eu gostaria de esquecer.
Resolvi fazer exatamente aquilo que eu sempre faço, quando se trata de Palmeiras: falar com a alma, com todo o meu coração!
Disse a ele que empatar e perder era muito ruim e que o gol, é de fato, o momento mágico do jogo, mas que aquele time não representava o Alviverde Imponente.
E comecei a contar a ele a história da Sociedade Esportiva Palmeiras.
Quando dei por mim, estava discursando empolgadamente, como se estivesse em um palanque eleitora.
Os olhinhos, eu me lembro bem, vidrados em mim, não piscavam…
Ele não disse nada.
O jogo terminou num empate insosso.
À essas alturas, toda família já se preparava para aceitar sua decisão de não ser palmeirense.
Mas eu não.
“Não vá brigar com o menino por causa disso filha”, meu pai me disse.
Mas eu não me conformava e por mais que soubesse que não poderia forçá-lo a torcer pelo Palmeiras, eu tinha que tentar.
Tinha que tentar mais uma vez.
Tinha que mostrar o meu grande pelo Palmeiras.
Resolvi convidá-lo para ir ao estádio novamente.
Ele aceitou, para minha surpresa, confesso.
Tarde de sábado. Pacaembu lotado. Palmeiras x Mirassol.
Do lado de fora dava pra ouvir a batucada contagiante da nossa torcida.
Ele olhava pra tudo, impressionado.
O jogo nem tinha começado, mas a torcida cantava sem parar.
“Quando surge o alviverde imponente, no gramado em que a luta o aguarda…”
Barulho ensurdecedor.
Aquela emoção por todos os poros!
Ele me olhou e com a mãozinha no peito, me perguntou:
“Tia Alê, tô sentindo uma coisa aqui coração, que eu não sei explicar…”
Estava visivelmente emocionado.
Eu jamais esquecerei daquele momento.
Com o choro na garganta e lágrimas nos olhos, eu lhe disse:
“Isso é ser palmeirense, Arthur! É ter esse sentimento único e inexplicável, que só quem é palmeirense, sente….”
À partir daquele dia, o pequeno coração dele, se vestiu de verde e branco, para sempre.
E o meu coração de tia, se encheu de orgulho, por ter sido responsável por aquele momento.
Muito tempo se passou desde que tudo aconteceu.
Hoje, ele faz quinze anos.
Passou rápido.
Passou voando.
Mas o amor pelo Palmeiras, não passou, e eu sei, que nunca passará.
Meu sonho?
É vê-lo um dia, com seu filho ou filha no estádio, contando a história da tia apaixonada que não sossegou, até transmitir a ele, todo aquele grande amor.
História, que sempre me faz chorar.
Autora : Alê Moitas