Era uma vez um garoto que amava futebol.

Apesar de ter nascido no Ceará, a separação de seus pais, mudou seu destino.

Aos treze anos, mudou-se para São Paulo, cidade que sua mãe escolhera para a iniciar uma vida nova.

Mesmo sendo muito jovem, começou a trabalhar como office boy para ajudar nas despesas de casa.

O garoto acostumado com o mar, agora tinha pela frente, a selva pedras.

Sim, ele amava futebol…

Quando ainda morava na terra natal, todo fim de semana ele e os amigos corriam na areia quente da praia… nos pés, uma bola.

Era o famoso “racha”.

“pelada” sagrada de todo domingo.

Mas embora a paixão pelo futebol tivesse nascido cedo, ele ainda não tinha se identificado com nenhum time de sua cidade.

Todos os garotos de sua idade torciam pelo Santos, que na época, estava no auge por causa de Pelé, mas ele não tinha sido fisgado pelo Peixe.

Mesmo admirando o grande craque, aquele time não havia mexido com ele.

Era um garoto diferente.

Nunca se identificara com o óbvio.

Não queria torcer por um time simplesmente porque todos torciam.

Queria escolher o seu time.

“A escolha de um time é algo especial”, pensava.

Afinal, é futebol!

Tinha que ser um time que tocasse a alma e o coração.

Não, ele não queria fazer parte de uma “massa” de torcedores.

Ele queria mais!

Um dia, já adaptado à garoa fria da cidade que nunca pára, parou num desses bares típicos do centro de São Paulo, para comer o seu famoso “PF” de todo dia.

PF: abreviação do paulista para ‘prato feito’, meu!

A televisão ligada, transmitia um jogo de futebol.

Imediatamente reconheceu que um dos times era o Santos.

O outro time, não conhecia e para sua surpresa, estava dominando o jogo.

Ele não conseguiu mais tirar os olhos da televisão.

No campo, o time que jogava contra o poderoso Santos de Pelé, tinha um estilo que lhe lembrou uma orquestra de tão sintonizado e bonito.

Eram passes perfeitos, como uma sinfonia tocada com os pés.

E no meio daquele jogo emocionante, um jogador lhe chamou especial atenção: estava com a camisa 10 e tinha um jeito de jogar magistral.

Em determinado lance, o tal jogador franzino e ágil, colocou a bola por entre as pernas de Pelé, num drible inacreditável! Uma caneta, para ser exata.

“Seria possível?” Pensou ele, impressionado.

Nunca havia visto tamanha originalidade de estilo.

Nunca imaginara um time que pudesse jogar de “igual pra igual”, com o time do Rei.

Nem um jogador como aquele, que não tomava conhecimento do ídolo do país.

Quanto mais o jogo seguia, mais nosso garoto estava hipnotizado pelo time que vestia verde e branco e que mostrava algo, que ele nunca tinha visto e que ainda não sabia nomear.

E o que era aquele jogador?!, pensou Ah… “aquele jogador tinha algo de divino“, foi o que ele ouviu tempos depois.

Dirigiu-se ao garçom que estava enxugando alguns copos atrás do balcão e que também acompanhava a partida e perguntou: “Quem é esse time que está jogando contra o Santos?”

Com os olhos arregalados, cheios de surpresa, o homem respondeu enfático: “Você só pode estar de brincadeira garoto! Não me diga que você ainda não conhece esse time! Esse time, meu jovem, é o Palmeiras!”

E ele continuou perguntando, ainda mais curioso, “e esse jogador vestindo a camisa dez?”

Com um certo brilho nos olhos e um sorriso simpático, ele lhe respondeu: “o craque que você está vendo, chama-se Ademir da Guia.”

“Palmeiras…”, sussurrou para si mesmo.

E enquanto caminhava pelas ruas de São Paulo, de volta ao trabalho, não conseguia parar de pensar naquele jogo.

Naquele time.

Naquele jogador.

Ele sabia que algo dentro dele havia mudado… para sempre!

Seu coração de garoto havia enfim, se apaixonado pela primeira vez!

Havia encontrava o que tanto procurava: um time que fizesse seu coração bater mais forte!

Ele ainda não sabia se esse time tinha muitas vitórias ou títulos.

Não tinha a menor ideia se a sua torcida era grande ou pequena.

Isso pouco importava.

Ele queria um time que entrasse em campo com aquela fibra.

Que carregasse o peso de sua camisa em cada lance.

Que jogasse com aquela paixão inexplicável.

Um time que superasse os clichés e saísse dos rótulos.

Não desejava o time da maioria.

Desejava um time que soubesse o que é superação.

Que colocasse a alma na chuteira.

Que tivesse sangue nos olhos para lutar e ao mesmo tempo, humildade para renascer das cinzas, se fosse preciso.

Ele queria um time que soubesse ser grande nas derrotas.

Imponente nas conquistas.

Agora, ele sentia-se completamente diferente.

Tinha encontrado o seu time.

Seu coração vestiu-se de verde e branco.

SOCIEDADE ESPORTIVA PALMEIRAS!

O ano? 1963.

O nome do garoto? Marcus Aurelius de Paiva Moitas, meu pai.